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Aquilo que te faça acelerar a bicicleta: o uso de transporte ativo como direito à cidade no pós-pandemia

*Por Juliana Guedes, membro da Liga de Políticas Públicas da PUC-Rio

1. INTRODUÇÃO

O ano de 2020 certamente entrará na história mundial como um ano de significativas mudanças comportamentais da sociedade. Marcado pela pandemia do Covid-19, todos os âmbitos sociais arriscam-se em invenções para driblar o contágio do vírus pelos quatro cantos do mundo. Entretanto, em meio a novas práticas e modos de viver, desigualdades foram desmascaradas frente às necessidades de medidas de segurança para frear a contaminação viral.

Aliado da aglomeração e do encontro, o novo coronavírus espraia-se com maior facilidade em conglomerados urbanos e com maior velocidade em favelas e ambientes com maior densidade habitacional. Esses mesmos locais, como se sabe, já são demarcados pela falta de infraestrutura e pela negligência pública, destacando ainda mais uma hierarquia social materializada pelas deficiências do neoliberalismo. Assim como bem diz a geógrafa Ana Fani:

“Nesta escala, a segregação sócioespacial ilumina a hierarquia social que se
realiza como hierarquia espacial, impondo acessos diferenciados aos lugares da cidade, pela imposição da propriedade privada, que produz e estrutura a sociedade desigual que vivemos. Esse movimento, em direção ao futuro se faz em detrimento do humano – que apenas sobrevive, e, agora, também da vida.” (CARLOS, 2020, p. 11)

Ao pensar em uma retomada das vivências urbanas na rua, o citadino é obrigado a tomar medidas de precaução que driblem o contágio do Covid-19. As novas medidas de segurança exigem esforços individuais que devem ser garantidos pelo aparato público, evidenciando a necessidade de políticas públicas. Porém, essa não é a realidade de cidades brasileiras demarcadas pela desigualdade social em que seus indivíduos são descuidados de seus direitos básicos, destacados pela aglomeração habitacional ou pela indispensabilidade do “ganhar pão do dia para o jantar da noite”.

“Ao ser destituído da totalidade urbana, o indivíduo dela se perde e a prática
socioespacial segregada repõe, constantemente, a negação do humano e da
cidade. Essas possibilidades já estão postas historicamente, pelo acesso
diferenciado, numa sociedade de classe, aos direitos à cidade e, neste caso, ao
direito à vida.” (CARLOS, 2020, p. 14)

Então, o desafio volta-se para o conhecido direito à cidade conceituado pelo francês Henri Lefebvre, na garantia de necessidades equitativas aos moradores urbanos, seja pela manutenção da possibilidade de quarentena ou pelos aparatos essenciais de mobilidade pelo tecido urbano. A cada momento inovadoras medidas e ideias surgem como resultado da crise
do coronavírus, mas são embarreiradas devido às práticas institucionais envoltas pela funcionalização do neoliberalismo nas cidades brasileiras. Assim, “se as distinções corpóreoterritoriais de direitos impõem condições perversas à pandemia, é preciso mobilizar existências para afrontar o destino socialmente imposto” (BARBOSA e TEIXEIRA, 2020, p.
76). Ou seja, em um espaço desigual, em que não há uma homogeneização de direitos indispensáveis ao momento de pandemia, são necessárias novas mobilizações de políticas públicas que visem a diminuição das desigualdades territorializadas.

Nesta perspectiva, o presente ensaio tem como objetivo central pensar na mobilidade urbana como direito à cidade e nas possíveis medidas que minimizem a possibilidade de contágio. Na busca do novo normal, o redesenho da cidade já está sendo marcado pela ampliação do uso de transportes ativos em vários lugares do mundo, como é o caso da bicicleta.
Acredita-se na efetividade desta nova prática para o ir e vir, entretanto, “compreender a dinâmica social que produz a desigualdade é fundamental para deslocar as estratégias de combate à pandemia.” (CARLOS, 2020, p 11). É nesse sentido que este trabalho procurar exemplificar os desafios da cidade do Rio de Janeiro com maior cuidado em sua análise espacial.

Assim, após esta introdução, será abordado o conceito do francês Henri Lefebvre e a importância da mobilidade urbana para o bem-viver nas cidades. Em um segundo momento, serão discutidas as novas medidas impostas pela pandemia e de que forma o transporte urbano pode responder às precauções do coronavírus com estímulo ao uso de bicicletas. Por fim, será iniciada uma breve análise do Rio de Janeiro e possíveis soluções para as novas normas da mobilidade na cidade.

2. DIREITO À CIDADE E MOBILIDADE URBANA

O conceito de direito à cidade tem origem no livro do sociólogo e filósofo francês Henri Lefebvre intitulado “O Direito à Cidade” e lançado em 1968 como celebração ao centenário do “O Capital” de Karl Marx. A publicação foi escrita em um momento de intensas revoltas na capital francesa Paris que foram acompanhadas por modificações no pensar do citadino
parisiense. Seguido por seus propulsores, David Harvey e Manuel Castells, esse conceito marxista é utilizado e bastante considerado até os dias de hoje, porém, muitas vezes é negligenciado pela sua principal premissa, a luta de classes.

A banalização do direito à cidade é observada quando utilizado pela instrumentalização de aprimoramento de políticas públicas desvinculada da participação social.

“O direito à cidade não pode ser concebido como um simples direito de visita ou de retorno às cidades tradicionais. Só pode ser formulado como direito à vida urbana, transformada, renovada. […] Só a classe operária pode se tornar o agente, o portador ou o suporte desta realização.” (LEFEBVRE, 1967, p. 116 e 117)

Por assim dizer, o conceito admite uma complexidade que é traduzida na universalidade dos direitos e cidadania do morador urbana que, para além da sua vivência na cidade, se institui como agente participante da produção do espaço urbano. Conhecido, então, como o direito que assumes todos os demais direitos, Lefebvre, ao propor teses de uma ciência analítica da cidade, mais uma vez salienta:

“Em condições difíceis, no seio dessa sociedade que não pode opor-se
completamente a eles e que, no entanto, lhes barra a passagem, certos direitos
abrem caminho, direitos que definem a civilização. Esses direitos mal
reconhecidos tornam-se pouco a pouco costumeiros antes de se inscreverem
nos códigos formalizados. Mudariam a realidade se entrassem para a prática
social: direito ao trabalho, à instrução, à educação, à saúde, à habitação, aos
lazeres, à vida. Entre esses direitos em formação figura o direito à cidade (não
à cidade arcaica, mas à vida urbana, à centralidade renovada, aos locais de
encontro e de trocas, aos ritmos de vida e empregos do tempo que permitem o
uso pleno e inteiros desses momentos e locais, etc).” (LEFEBVRE, 1967, p.
143)

Esse sentido aponta que para além de cumprir os desejos dos indivíduos, o direito à cidade deve construir um espaço acessível a todos. A acessibilidade nesse momento é vista como a real mobilidade entre os citadinos. O direito de locomoção entre as áreas urbanas é importante já que leva a outros ambientes de garantia de direitos, como a escolas e hospitais, por exemplo. Assim, “não há direito à cidade sem mobilidade urbana. Não há espaço de direito se esse espaço for vedado à livre movimentação daqueles que nele vivem e habitam” (VELOSO e SANTIAGO, 2017, p. 17).

As políticas de mobilidade urbana brasileira, entretanto, vão de encontro com as medidas democráticas que se esperam pela plenitude do direito à cidade. Isso porque a malha modal do país é baseada em vias rodoviárias que prevalecem o uso de transportes motorizados no lugar de transportes ativos. O incentivo da política brasileira ao setor automobilístico em
meados do século XX no processo de industrialização do país gerou a insurgência do desejo do carro particular. Aliado a isso, as facilidades de financiamento vistas nos últimos anos e a massificação dos transportes públicos protagonizaram a corrida do cidadão brasileiro em busca
do seu carro próprio. Apesar de ter saciado o desejo do homem moderno e aumentado o número de carros na rua, essas medidas levam a um enclausuramento do indivíduo dentro de seu espaço privado e negligenciam o comportamento fundamental do espaço urbano: o encontro. Ademais, o uso de carros particulares é restritivo quanto ao poder aquisitivo de cada cidadão e contribuiu para a emissão de poluentes indesejáveis para o bem-estar da cidade.

É nesse sentido que as medidas democráticas a serem implementadas em centros urbanos devem considerar a mobilidade urbana como essencial na garantia do direito à cidade. Ela é o principal vetor de locomoção da vida do indivíduo capaz de levá-lo a garantia de seus outros direitos, como a saúde, educação, lazer, habitação e, essencialmente, a construção
dialética entre o espaço e seus habitantes. As propostas, entretanto, não devem ser limitar ao uso de automóveis privados, abrindo espaço também para questões sociais de gênero, raça e as contemporâneas questões ambientais.

3. PANDEMIA E TRANSPORTE ATIVO

Em meio a pandemia do coronavírus, um dos desafios dos pensadores urbanos é a implementação de medidas eficazes que fujam do desejo do individualismo e enclausuramento causado pela eminencia de contágio viral. Isso porque, por ser uma doença que se propaga em
aglomerações e proximidade, o medo gerado ocasiona a imediata corrida aos espaços privados em detrimento dos espaços públicos. Assim, ao se falar de mobilidade urbana, estima-se que o número de congestionamentos urbanos aumente, já que possíveis usuários de transportes
públicos não se sintam mais confortáveis em aglomerar-se em modais lotados. Porém, sabe-se que essa possibilidade não é a realidade da maioria dos brasileiros que dependem do dia a dia dos transportes de média e alta capacidade.

No período de isolamento social, o transporte coletivo sofreu alterações significativas, porém depreciativas. Em regiões metropolitanas, como a do Rio de Janeiro, o transporte rodoviário diminuiu 50% de sua frota e passou a operar em horários de finais de semana, com capacidade reduzida, algumas linhas foram suspensas e até mesmo ônibus intermunicipais
cancelaram seus trajetos. Essas medidas, ao contrário do que se esperava, não surtiram efeito ao desestímulo do uso de transporte coletivo, apenas ajudaram para a lotação e contribuíram para a disseminação da doença por aqueles não-contemplados pelo home office.

Em estudos realizados pelo LabCidade em junho de 2020, foi mapeado e comprovado que os indivíduos que precisaram utilizar o transporte público na cidade de São Paulo foram mais afetados pelo coronavírus, sendo possíveis vetores da disseminação da doença para outras áreas da cidade. O mapa considera uma leitura complexa da dimensão territorial trazida pelo
Covid-19, compreendendo como que a origem do fluxo de pessoas em circulação durante a pandemia nos mostra a maior incidência de hospitalizados pela doença. Na pesquisa foi considerado apenas passageiros sem ensino superior e em cargos não executivos, pois acreditase que são esses os inviabilizados de exercer o seu trabalho de forma remota.

Figura 1 – Mapa: Concentração de hispitalizações por SRAG (18/mai) e distribuição das origens de viagens de transporte público.

Fonte: LabCidade

Apesar de não haver comprovação de que o contágio se deu dentro do transporte coletivo, atenta-se para o perigo de vetorização desses usuários. A comprovação dada por esses novos dados alerta para medidas mitigatórias emergenciais que abarquem a mobilidade urbana,
fazendo-se necessário o repensar sobre a forma em que os citadinos circulam pelo espaço urbano.

A relação entre cidades e pandemias não é uma novidade, o sistema de saneamento e o alargamento das principais vias marcam crises de saúde coletiva de séculos anteriores. Ao seguir a mesma lógica, espera-se que o planejamento urbano sofra modificações ao preparar as cidades para o pós-pandemia. Para além disso, cresce também a preocupação de futuras crises sanitárias e climáticas. Esse cuidado é notório ao observar representantes de diversas cidades do mundo inteiro utilizando do período de isolamento social para aumentar a malha cicloviária e expandir calçadas para uso exclusivo do pedestre.

A micromobilidade, segundo o Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), é a crescente família de veículos leves e pequenos com velocidade máxima de 25km/h ideais para uma distância de até 10km, podendo ser individuais ou compartilhados, elétricos ou
manuais. São necessárias implementações de infraestrutura capazes de promover um acesso mais seguro e equitativo para a sociedade. Seguindo o mesmo instituto de pesquisa, devem ser construídos 4 tipos de vias: ciclovias, ciclovias expressas, vias calmas e vias arteriais. Além da
construção de estacionamentos e incentivo público.

Algumas cidades já apresentam projetos quanto a ampliação de suas vias. Antes do lockdown total, a cidade de Nova Iorque apresentou um aumento de 52% de ciclistas comparado ao mesmo período do último ano. Na cidade de Chicago, por exemplo, houve 82.112 viagens com bicicletas compartilhadas entre 1 a 11 de março, enquanto no ano de 2019 houve 40.078 nos mesmos dias. Já a cidade de Bogotá expandiu suas ciclovias com novos trechos temporários em 76km no começo da pandemia como uma forma de manter o distanciamento e a lotação dos transportes públicos, diminuindo a propagação do vírus.

Assim, o redesenho estimado para futuros planos urbanos deve contar com a presença de ciclovias. A bicicleta é uma alternativa a ser considerada, pois é acessível quando comparada a um carro próprio, diminui a quantidade de congestionamento, garante a baixa poluição nas cidades e, além disso, contribui para uma visa saudável e ativa. Tal prática é considerada pela Organização Mundial da Saúde uma boa alternativa para a mobilidade durante a pandemia.

4. ANÁLISE SOBRE A CIDADE DO RIO DE JANEIRO

A cidade do Rio de Janeiro é a segunda maior capital brasileira e apresenta relevância internacional, principalmente após sediar os mega eventos. Possui 548 km de ciclovia espalhados por seu território, segundo dados levantados pelo G1 (2018). Entretanto, seu principal uso é destinado a lazer e turismo, deslocando-se do uso como modal cotidiano. Por
esse motivo, concentra-se na região sul da cidade e à beira-mar, locais dos principais atrativos turísticos do Rio de Janeiro. Assim como pode ser observado na Figura 2 em que as marcas em vermelho representam as ciclovias já implementadas, em azuis são as projetadas e em amarelo
são as interditadas.

Figura 2 – Mapa digital de rota cicloviárias na cidade do Rio de Janeiro

Fonte: Data.Rio

As principais atividades econômicas da cidade concentram-se na região central e sul, onde apresenta o seu maior custo de vida. Influenciada pelo histórico do planejamento carioca, as classes mais baixas acomodam-se no subúrbio ou na periferia geográfica da cidade. Outra questão essencial para a análise no Rio de Janeiro é a consideração de sua Região Metropolitana, visto que 65,4% dos 44% dos trabalhadores que não trabalham em seu
município de origem possuem a capital do Rio como destino (Censo, 2010). Dessa forma, o planejamento de mobilidade urbana deve trabalhar de maneira integrada, visto que o fluxo intermunicipal é bastante expressivo. Esse caráter metropolitano também é observado ao analisar o espraiamento de contágio da Covid-19 pela cidade.

Ao pensar na possibilidade de uma mobilidade voltada para o transporte ativo, como o uso de bicicleta, torna-se impossível que a maior parte de sua população o utilize em sua totalidade no trajeto casa-trabalho. Porém, acredita-se que o uso da intermodalidade seja a principal saída para o problema levantado. A utilização da bicicleta seria aliada aos trajetos
alimentadores que levam o indivíduo de sua casa até a estação mais próxima de um transporte de alta ou média capacidade, que hoje é realizada por algum outro modal coletivo ou ilegal. No Rio de Janeiro, 87% da população moram a um raio de 3km de algum sistema de média e alta
capacidade e 59% na Região Metropolitana (ITDP, 2016). Assim, a construção de infraestruturas para o transporte ativo parece ser favorável.

Para além dos trajetos usuais de casa-trabalho, as viagens para compras essenciais, como mercado ou farmácia, e práticas de lazer também são bem vistos à expansão do uso de bicicletas. O Projeto PedalAr criado em meio a pandemia do coronavírus é o primeiro sistema de bicicletas compartilhadas da Baixada Fluminense, localizado no município de Queimados, Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Criado por um ciclista da região como uma alternativa aos moradores, o raio de alcance abrange 5 bairros de Queimados e custa $5 a cada hora alugada.
Dessa forma, remete-se ao conceito de direito à cidade abordado na primeira sessão do ensaio em que a garantia de direitos aos citadinos deve ser acompanhada da sua própria construção:

“Apenas grupos, classes ou frações de classes sociais capazes de
iniciativas revolucionárias podem se encarregar das, e levar até a
sua plena realização, soluções para os problemas urbanos; como
essas forças sociais e políticas, a cidade renovada se tornará obra.
Trata-se inicialmente de desfazer as estratégias e as ideologias
dominantes na sociedade atual.” (LEFREBVRE, 1967, p. 111)

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como presenciado por outras crises mundiais, a pandemia da Covid-19 deve redesenhar o futuro das cidades mundiais. A fim de mitigar futuras crises sanitárias e climáticas, espera-se que os próximos planejamentos urbanos se voltem para a sustentabilidade do viver na cidade, priorizando transportes ativos e a manutenção de áreas verdes. Esse novo olhar já estava nas agendas internacionais, como a Agenda 2030 e os seus 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, porém, a urgência de novas respostas para os problemas pandêmicos será um catalizador para o cumprimento das propostas ambientais.

O uso da bicicleta como alternativa vai contra o padrão institucional da mobilidade urbana presente nas metrópoles brasileiras, principalmente na cidade do Rio de Janeiro. Além disso, a notoriedade dos transportes coletivos no momento de disseminação da doença viral surge para além da locomoção urbana, mas também como um serviço essencial para o direito à vida. A participação popular e o projeto PedalAr constitui um poder coletivo que pretende remodelar os processos de urbanização, aproximando-se do conceito de direito à cidade proposto por Henri Lefebvre. Sendo assim, espera-se que as políticas públicas se voltem para o
aprimoramento da micromobilidade e o incentivo de uso de transportes ativos, ocasião que deveria ser catalisada e acelerada em meio às inovações do planejamento em momento de pandemia.


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Idealizada na PUC-Rio e focada na realidade brasileira, a Liga de Políticas Públicas da PUC-Rio visa o estudo e a discussão das boas práticas políticas. É também parceira da Iniciativa RioMais.


* As opiniões expressas neste texto são de exclusiva responsabilidade do autor.
** Foto de Divulgação: Murillo de Paula/Unsplash

Referências Bibliográficas

BARBOSA, Jorge Luiz Barbosa; TEIXEIRA, Lino. Territórios populares entre as desigualdades profundas e o direito à vida. IN: COVID-19 e a crise urbana. Org GESP: Grupo de Geografia Urbana Radical. 2020. P. 67 – 77

CARLOS, Ana Fani A. A “revolução” no cotidiano invadido pela pandemia. IN: COVID-19 e a crise urbana. Org GESP: Grupo de Geografia Urbana Radical. 2020. P. 10-17

CÉSAR, Yuriê Baptista. A garantia do direito à cidade através do incentivo ao uso da bicicleta nos deslocamentos urbanos. Defesa de Monografia. UNB, 2010

G1. Malha cicloviária das capitais cresce 133% em 4 anos e já passa de 3 mil quilômetros. Disponível em: c. Acesso em 15 de julho de 2020.

KLINTOWITZ, Danielle Cavalcanti. As lutas nas cidades hoje. ORG. Stacy Torres e Tama Savaget [et al.] – São Paulo : Instituto Pólis, 2019

LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. Tradução de Rubens Eduardo Frias. São Paulo: Centauro, 2009

MACHADO, Danielle Carusi; MIHESSEN, Vitor. Mobilidade Urbana e mercado de trabalho na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Sebrae: Estudo Estratégico nº6. 2016

MARQUES, Rafaela. A bicicleta como uma aliada no acesso ao transporte coletivo. 2016. ITDP Brasil. Disponível em: https://itdpbrasil.org/a-bicicleta-como-uma-aliada-no-acesso-aotransporte-coletivo/. Acesso em 15 de julho de 2020

MELO, Juan. Em tempos de pandemia, prioridade para as bicicletas. ITDP. 2020. Disponível em: https://itdpbrasil.org/colabora-em-tempos-de-pandemia-prioridade-para-asbicicletas/. Acesso em: 15 de julho de 2020.

ROLNIK, Raquel. Circulação para trabalho explica concentração de casos de Covid-19. Caos Planejado. 2020. Disponível em: https://caosplanejado.com/circulacao-para-trabalho-explicaconcentracao-de-casos-de-covid-19/. Acesso em: 15 de julho de 2020

VELOSO, Sérgio; SANTIAGO, Vinícius. Ninguém entra, ninguém sai: mobilidade urbana e direito à cidade no Complexo do Alemão. – Rio de Janeiro: Fundação Heinrich Böll, 2017.

WHO. Moving around during the COVID-19 outbreak. Disponível em:
https://www.euro.who.int/en/health-topics/environment-and-health/Transport-andhealth/publications/2020/moving-around-during-the-covid-19-outbreak Acesso em: 14 de julho de 2020.

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Uma análise sobre os refugiados na cidade do Rio de Janeiro

*Por Laura Soares Lima e Vivian Garnica Chiaini Villar, membros da Liga de Políticas Públicas da PUC-Rio

1. INTRODUÇÃO

“Art. 1º: Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que: I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país; II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior; III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.” (BRASIL, Lei 9.474/97)

Desde o início do século XXI, houve um grande aumento no número de refugiados recebidos pelo Brasil. São tamanhas violações de direitos fundamentais, que as pessoas precisam fugir de seus países de origem em busca de um local onde possam se assentar com maior estabilidade política e socioeconômica. Esse aumento de fluxo faz com que o governo necessite estar preparado para receber tais indivíduos e, consequentemente, promover políticas públicas que permitam sua integração na sociedade.

Os refugiados não perdem sua nacionalidade, porém, por determinadas condições, não podem mais exercer direitos fundamentais como “ir e vir”. Logo, os Estados que estão provendo proteção jurídica devem assegurar direitos mínimos existenciais, como à vida, à saúde, à educação, ao trabalho, à liberdade, entre outros. Dessa forma, busca-se proporcionar ao refugiado a dignidade humana que lhe cabe, assim como uma realidade livre de violência.

Todavia, há um longo processo burocrático até que um indivíduo seja reconhecido na sociedade brasileira como refugiado. Primeiramente, é necessário fazer o pedido de refúgio de acordo com a Lei 9.474/1997 que define os mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951 e suas providências. Esse trâmite legal administrativo deve ser iniciado na Polícia Federal, que avalia as circunstâncias que motivaram o pedido. Devido ao grande número de pessoas passam por esse processo, até o procedimento ser deferido, ou indeferido, pode ocorrer um longo prazo de espera.

Conforme a 4ª edição do Refúgio em Números, que pode ser encontrada na página do Ministério da Justiça e Segurança Pública, ao final de 2018, aproximadamente 70 milhões de pessoas tiveram que sair de seus países de origem, sendo 25,9 milhões refugiadas e mais de 3,5 milhões solicitantes de reconhecimento de refúgio. Diante disso, deve-se entender que o destino desses indivíduos não representa uma realidade paralela ao Brasil, e muito menos à cidade do Rio de Janeiro. Em 2018, havia mais de 11 mil pessoas reconhecidas como refugiadas residindo em solo brasileiro, segundo a ACNUR. E, de acordo com o artigo “Números do Refúgio no Rio de Janeiro”, até dezembro de 2015, na cidade, o total de refugiados e solicitantes de refúgio representava mais de 6.500.

Insta observar que, um aumento expressivo ocorreu em 2020: além de terem ocorrido por volta de 17.800 decisões, entre janeiro e maio do referido ano, sobre pedidos de reconhecimento da condição de refúgio, segundo a PARES-Cáritas RJ, o total de pessoas reconhecidas chegou a atingir a marca de 43 mil. Para a mencionada instituição, esse acréscimo bastante significativo ocorreu devido a 3 grandes levas de aprovação dos pedidos realizados por venezuelanos (dezembro de 2019, janeiro de 2020 e abril de 2020), quando filhos de refugiados provindos do mencionado país foram, por fim, reconhecidos.

Portanto, tendo em vista a importância da temática do presente artigo, que cada vez mais aumenta em razão do número de pessoas que requerem o refúgio (como é passível de se visualizar no gráfico a seguir), mostra-se imprescindível que políticas públicas estejam presentes no cotidiano dos refugiados, e solicitantes de refúgio, a fim de terem resguardados seus direitos básicos. Afinal, são pessoas que, bravamente, tiveram que sair de suas casas em busca do respeito de um dos mais fundamentais direitos humanos: a vida.

Gráfico 1 – Pessoas Refugiadas Reconhecidas no Brasil (2011-2018)

Fonte dos dados: “Refúgio em Números 4ª edição”. Disponível em: https://www.justica.gov.br/seus- direitos/refugio/refugio-em-numeros. Acesso em: 30/07/2020.

2. A PESSOA REFUGIADA E O SOLICITANTE DE REFÚGIO NO BRASIL

Conforme a Lei 9474/97, de julho de 1997, em seu art. 1º, refugiado é todo o indivíduo que, seja por graves e generalizadas violações de direito humanos, seja por perseguições motivadas pela raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, esteja em outro país que não o de sua nacionalidade, não podendo retornar ou não querendo regressar. Além disso, há a possibilidade de o indivíduo não ter nacionalidade e estar fora do país onde possuía residência habitual, não podendo retornar pelos fundamentos descritos (inciso II).

Diante disso, para que uma pessoa possa ser, de fato, considerada como refugiada, mostra-se necessário que sua condição seja reconhecida pelo país em que se encontra. Para tanto, no Brasil, deve requisitar à instituição competente, qual seja a Polícia Federal, a solicitação de refúgio, de modo que o Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) irá analisar e decidir os pedidos de refúgio, segundo o Ministério de Justiça e Segurança Pública.

Assim, a autoridade irá notificar o solicitante, segundo o art. 18, da Lei 9474/97, para prestar declarações sobre seu pedido, mediante data agendada, além de informar ao Alto Comissariados das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) sobre a situação, garantindo ao órgão a possibilidade de oferecer sugestões que facilitem o procedimento. Após, com a ajuda de intérprete, se necessário, deve preencher a solicitação com sua identificação completa, bem como expor as circunstâncias que possam fundamentar seu requerimento, indicando, para tanto, provas pertinentes (art. 19).

Vale ressaltar que, além de poder expressar sua vontade de refúgio a qualquer autoridade que se encontre na fronteira, de modo que esta irá informar sobre os procedimentos cabíveis, segundo o art. 7º, da Lei 9474/97, em nenhuma hipótese pode ser o indivíduo deportado para fronteira de território em que sua vida ou liberdade esteja ameaçada, exceto se a sua presença for considerada como perigosa para o Brasil. Ainda, pelo art. 10, da mencionada Lei, caso o ingresso em território nacional seja irregular, não se configura o ato como impedimento para a solicitação de refúgio. E, a partir do momento em que o referido pedido é iniciado, são suspensos quaisquer procedimentos administrativos ou criminais motivados pela entrada irregular. Logo, sendo a condição reconhecida, o procedimento que trata da infração será arquivado e, após comunicação do ocorrido à Polícia Federal, esta irá transmitir a decisão ao órgão julgador.

Insta observar, por fim, que durante todo o procedimento da solicitação de refúgio, os estrangeiros, se assim desejarem, possuem direito de serem assistidos pela Defensoria Pública da União ou pelas organizações jurídicas parceiras da ACNUR, de forma gratuita. E, além do Protocolo de Solicitação de Refúgio, poderão ser obtidos em caráter provisório, até a decisão final (quando serão expedidos de forma definitiva), os seguintes documentos: Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) e Cadastro de Pessoa Física (CPF). Ademais, estando em território nacional, possuem acesso a todos os serviços públicos disponíveis, como escolas, hospitais e postos de saúde.

3. A QUESTÃO TRABALHISTA NO BRASIL E NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO

No Brasil, a questão empregatícia dos refugiados é pouco falada, uma vez que a legislação parece ser perfeitamente completa sobre o assunto. A Constituição Federal tem como uma de suas cláusulas pétreas a proibição da discriminação de pessoas por motivo de raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional, estado civil, etc. Também, não é permitida qualquer “distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidade ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão”, como previsto no art. 1º da Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho. Nesse sentido, assim como os estrangeiros que passam a trabalhar e empreender no país, os direitos dos refugiados são assegurados pela Lei da Imigração, que em seu 3º artigo garante, entre outros princípios, o acesso igualitário ao trabalho.

“Art. 3º: A política migratória brasileira rege-se pelos seguintes princípios e diretrizes:(…) XI – acesso igualitário e livre do migrante a serviços, programas e benefícios sociais, bens públicos, educação, assistência jurídica integral pública, trabalho, moradia, serviço bancário e seguridade social;”(BRASIL, Lei 13.445 de 2017)

As relações de emprego no Brasil são regidas pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), na qual foram regrados os direitos e obrigações dos empregados e empregadores. Desse modo, o trabalho formal foi estabelecido, sendo caracterizado por seu emprego com vínculo, ou seja, carteira de trabalho assinada. Porém, é muito comum os casos em que existe esse emprego na informalidade, no qual o indivíduo não tem nenhum tipo de registro em relação àquele trabalho. Um exemplo comum, no Brasil, é o comércio de rua, como os vendedores ambulantes, ou em pequenas empresas que descumprem as normas. Nesse sentido, os direitos dos sujeitos empregados nessas situações não são cumpridos, entre eles as férias, a remuneração fixa e as horas extras. Porém, muitas vezes, apesar do vínculo formal do trabalho, ainda é comum encontrar casos em que os empregadores não cumprem seus deveres, e isso afeta, principalmente, os refugiados, que têm maior dificuldade para se integrarem à realidade do país. Com isso, seja por falta de informação ou condição de exigi-la, podem acabar se conformando com os que lhes é oferecido.

Não é incomum encontrar denúncias de trabalhadores estrangeiros que entraram por situações adversas no país, de forma irregular ou, devido a dificuldade do idioma, serem obrigados a trabalharem em condições análogas à escravidão em fábricas de alimento e tecido, por exemplo (FELLET, 2012). Internacionalmente, essa não é considerada uma forma de trabalho e, sim, um proveito desleal das condições desfavoráveis daqueles indivíduos. Portanto, para que esteja de acordo com a Constituição Federal, é preciso que o seu mais importante princípio seja respeitado, o da dignidade humana, e isso somente é possível por meio da oferta de trabalho na forma prevista pela ordem jurídica nacional (BRITO FILHO, 2004).

O Brasil ratificou a Convenção de Genebra de 1951 e, em seus artigos 17, 18 e 19, “impõe aos seus signatários o dever de tratamento igualitário aos refugiados no que se refere ao trabalho”. Ainda, a Convenção de 97 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), também confirmada pelos legisladores brasileiros, assegura o mesmo tratamento aos trabalhadores brasileiros e estrangeiros que morem no país (PASCHOAL, 2012). Contudo, apesar das normas serem favoráveis, muitas vezes, não há seu cumprimento na prática.

Um exemplo que ficou famoso, no ano de 2018, foi a exploração de venezuelanos que estava ocorrendo em Roraima, tendo até mesmo a ONU envolvida – afirmando que o fechamento de fronteiras não seria uma solução e sim a construção de pontes e apoios. A procuradora Cristiane Lopes do Ministério Público do Trabalho enumerou os setores que detêm maior número de denúncias de violação trabalhista dos estrangeiros que atravessam a fronteira:

“Trabalho rural, trabalho doméstico, trabalho na construção civil e trabalho no comércio. Estas são as oportunidades que estão sendo oferecidas aos migrantes no local. Geralmente, essas oportunidades são sem carteira de trabalho e em valor inferior ao que é pago para brasileiros que aceitam os mesmos postos de trabalho” (Agência Câmara de Notícias, 2018)

No Rio de Janeiro essa realidade não é diferente, podendo até ser considerada mais complexa por ser um dos principais destinos dos imigrantes em situação de refúgio no Brasil (INDA, 2017). Assim, é necessária a existência de uma completa rede de apoio a esses que estão em uma situação de vulnerabilidade, para que esses indivíduos possam dar continuidade em suas vidas, havendo assimilação com a sociedade que os recebeu. Isso pode ocorrer por meio das redes sociais e de apoio constituídas pelos órgãos públicos, entidades do terceiro setor ou até mesmo organismos internacionais.

Essas atividades não são limitadas a orientações, mas também com tipos de atendimento de apoio aos refugiados – tais como a elaboração de pareceres que podem ser utilizados pelo Conare na decisão de deferir ou não solicitação de refúgio (art. 4º, III, da Resolução Normativa nº 18 do Conare, de 30 de abril de 2014). Isso está diretamente ligado às condições trabalhistas, já que esse sujeito, dependendo do resultado de seu pedido, poderá se encontrar em situação irregular ou indocumentado. Assim, há uma maior vulnerabilidade, pois a probabilidade de tirarem proveito dessas pessoas é maior. Logo, trabalhos como da organização “Programa de Atendimento a Refugiados e solicitantes de Refúgio – PARES Cáritas RJ” é essencial.

4. DIFICULDADES   ENCONTRADAS   PELOS    REFUGIADOS   DURANTE   A PANDEMIA DO CORONAVÍRUS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO

A pandemia da COVID-19 trouxe diversas vulnerabilidades para toda a população brasileira, porém, assim como para indivíduos com menor renda, o grau de insegurança dos refugiados se acentuou. Nesse sentido, a assistente social do Centro de Apoio e Pastoral do Milagre (CAMI), em São Paulo, Carla Aguiar (SUDRÉ, 2020) ressaltou que a maioria dos indivíduos atendidos pelo Centro se encontra em trabalhos informais que foram fortemente atingidos pelo coronavírus. Isso faz com que esses sujeitos não consigam arcar com os custos de aluguel de onde moram, por exemplo, sendo muitas vezes despejados.

“Muitos imigrantes estão sendo despejados de onde moram e outros levam-os para onde estavam morando. Então, em uma casa onde cabe dois ou três, estão morando cinco, seis, oito pessoas. E se um se contamina, contamina todo mundo. Dizem que tem que se proteger. Mas se proteger como, se eles estão em lugares com mais de oito ou dez pessoas? É difícil” (AGUIAR, 2020)

Em busca de facilitar a vida das pessoas que mais precisam, o governo brasileiro disponibilizou o auxílio emergencial de R$600, do qual os refugiados também têm direito. Porém, a dificuldade de acesso é gigantesca. Aguiar diz que as políticas propostas para a proteção dessas populações de fato são prodigiosas, afinal, grande parte das vezes não corresponde com a realidade.

Os problemas cotidianos que já existiam anteriormente, com a pandemia se acentuaram. Houve o aumento da xenofobia e racismo, devido a esses indivíduos serem considerados possíveis portadores do vírus, por conta de seus países de origem – e, pela falta de informação da sociedade, pode, até mesmo, ocorrer uma instabilidade mental nos refugiados. Assim, além de terem que se preocupar com a questão da insalubridade dos locais que vivem, e da possível contaminação em seus trabalhos, que em grande parte são em locais de risco, passam a ter mais dificuldade de manter suas saúdes físicas e mentais estáveis.

Além disso, as crianças acabam por enfrentar suas próprias dificuldades desse contexto. A pandemia fez com que as escolas parassem com suas aulas temporariamente, tornando limitado o acesso aos estudos. Porém, com a volta progressiva de alguns colégios, por meio do ensino a distância, a desigualdade do acesso à educação ficou evidente.

“A vulnerabilidade socioeconômica não permite que se pague uma boa internet para que essas crianças possam estudar” (AGUIAR, 2020)

Com tantas dificuldades econômicas enfrentadas pelos refugiados, mostra-se praticamente impossível esperar que o conteúdo seja acompanhado pelos estudantes de maneira adequada, uma vez que a falta de infraestrutura é imensa. Nessa perspectiva, é inegável a urgência da discussão da mencionada pauta, assim como a necessidade de serem apresentadas soluções para essa parcela da sociedade.

5. GARANTIA DE DIREITOS BÁSICOS PARA REFUGIADOS E APLICAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO

O Brasil possui um papel importante sobre a temática em questão. Afinal, foi o primeiro país da América da Sul a regulamentar a proteção dos refugiados, quando aprovou a Convenção de Genebra de 1951, em novembro de 1960. Ainda, aderiu, em 1972, o Protocolo de Nova Iorque de 1967. E, além disso, foi o primeiro a elaborar uma lei apenas sobre refugiados, qual seja a Lei 9474 de 1997.

Não distante dessa realidade nacional, a cidade do Rio de Janeiro possui papel fundamental à contribuição da garantia dos direitos dos refugiados. Em 1977, foi instalado um escritório ad hoc, a partir de um acordo entre a ACNUR e o Brasil, por conta da instável situação política pela qual a América Latina enfrentava na época (CHIAPETTI, 2010). Contudo, em razão do Brasil também, à época, encontrar-se nas mesmas condições, inclusive com a presença da violação de direitos humanos, conforme Thatiane Chiapetti:

“O escritório do ACNUR aqui instalado atuava principalmente com o reassentamento, em um terceiro país, dos refugiados políticos de nossos países vizinhos, mormente argentinos, chilenos, uruguaios e bolivianos, pois como o Brasil mantinha a reserva referente ao conteúdo geográfico da Convenção de 1951, não podia acolher latino-americanos em seu território, assim somente o visto de turista para uma estadia provisória de 90 dias lhes era concedido.” (CHIAPETTI, 2010)

Diante disso, vislumbra-se que a questão aqui exposta se encontra de maneira intrínseca ao histórico brasileiro. Inclusive, segundo Liliana Lyra Jubilut:

“Além de obrigar o Brasil a zelar pelo respeito aos direitos humanos e a conceder asilo, assegurando mediatamente o refúgio, a Constituição Federal de 1988 estipula a igualdade de direitos entre os brasileiros e os estrangeiros – incluindo-se os solicitantes de refúgio e os refugiados – do que se depreende que, salvo as exceções nele previstas, este documento coloca o ordenamento jurídico nacional, com todas as suas garantias e obrigações, à disposição dos estrangeiros que vêm buscar refúgio no Brasil.” (JUBILUT, 2007)

Dito isto, entende-se que os refugiados têm reservados a garantia de direitos, afinal, como bem dispõe o art. 5º, da Lei 9474/97:

“O refugiado gozará de direitos e estará sujeito aos deveres dos estrangeiros no Brasil, ao disposto nesta Lei, na Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951 e no Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967, cabendo-lhe a obrigação de acatar as leis, regulamentos e providências destinados à manutenção da ordem pública.” (BRASIL, Lei 9.474 de 1997)

Assim, deve-se realizar uma análise, mediante foco na cidade do Rio de Janeiro, a fim de saber se, de fato, há a aplicação de medidas para que os direitos básicos sejam garantidos.

a) Saúde

O Brasil possui a Lei 8080/90, que dispõe sobre a questão de saúde em território nacional. E, segundo seu art. 2º, a saúde é um direito fundamental do ser humano, de tal modo que o Estado deve prover seu pleno exercício. Ainda, pelo art. 7º, I, da referida Lei, o SUS, sendo desenvolvido de acordo com o art. 198, da Constituição Federal de 1988, obedece ao princípio da universalidade de acesso aos serviços de saúde. Assim, percebe-se que a saúde é um direito de todos os cidadãos, não importando a nacionalidade.

Diante disso, na cidade do Rio de Janeiro, pode o refugiado procurar atendimento, como bem dispõe o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos, no Centro de Saúde ou Clínica da Família que se encontre mais próxima do indivíduo. Vale ressaltar, contudo, que diversas problemáticas podem ser verificadas nessa busca por atendimento, como a barreira do idioma.

Quanto ao empecilho das diferenças de idioma, seria interessante que houvesse um programa de tradução específico com termos médicos em unidades de saúde pública. Ou mesmo, pessoas especializadas em tradução desse estilo para auxiliar nos atendimentos. Vale ressaltar que, em 2019, foi lançado um aplicativo, chamado OKA, pelo Instituto Igarapé, que tem como objetivo ajudar migrantes e refugiados na capital que estejam em busca de serviços internos e políticas públicas, tal como a saúde (GANDRA, 2019).

Além disso, de acordo com a publicação “Recomeço”, proveniente de colaboração entre a pasta do SUS na cidade e a Cáritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro, entidade parceira da ACNUR, diversas outras demandas foram constatadas. Um exemplo citado que se mostrou altamente relevante foi a necessidade de um programa especial de saúde mental, já que, como identificado, muitos refugiados podem se sentir sobrecarregados, desamparados e enfrentando um luto extremo ao terem perdido pessoas em suas terras natais.

b) Alimentação

A Constituição de 1988, conforme prevê seu art. 6º, garante o direito à alimentação para todos os cidadãos. Tendo isso em vista, no município do Rio há a presença de restaurantes populares que auxiliam na garantia de tal direito social. Cabe mencionar, também, que o PARES Cáritas RJ possui um Programa de Atendimento a Refugiados em que, quando o solicitante de refúgio chega ao instituto pela primeira vez, são fornecidas as informações necessários para o requerimento, além de atendidas as necessidades mais urgentes, como alimentação, higiene, vestuário e saúde.

c) Educação

A educação é um direito básico implementado desde a Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989 e a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951. Contudo, segundo publicação da Unesco:

“A existência de crianças e adolescentes refugiados fora da escola é uma questão de grande preocupação. Entre os refugiados, apenas 50% das crianças frequentam a educação primária e apenas 25% estão na educação secundária.” (MOUMNÉ e SAKAI, 2019, p.7)

Essa realidade é observada principalmente, além da já mencionada barreira linguística em tópico anterior, na falta de preparo para que as escolas recebam refugiados. São necessários mais debates sobre a temática entre o corpo discente, além de uma maior sensibilização e treinamento do corpo docente perante uma criança ou adolescente, por exemplo, que vem de uma cultura distinta e pode se encontrar com algum tipo de trauma. Ademais, há a questão burocrática sobre a exigência de determinados documentos que podem dificultar o ingresso no ambiente escolar.

Vale ressaltar que, há a aplicação do EJA (Educação de Jovens e Adultos), uma modalidade de ensino criada pelo Governo Federal, no município do Rio de Janeiro. Trata-se de um ensino destinado aos jovens, adultos e idosos que não completaram os níveis de educação básica na idade apropriada, possibilitando que o aluno possa concluir os estudos em menos tempo que o usual. Deste modo, os refugiados que se mostram nessas idades, se assim desejarem, podem utilizar do referido programa público.

Por fim, mostra ser imprescindível mencionar que pessoas refugiadas ou solicitantes de refúgio, segundo o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (5), que possuem certificado ou diploma de qualificação, podem, conforme o art. 44, da Lei 9474/97, ter o reconhecimento de sua validade de forma facilitada por conta da situação excepcional em que se apresentam. A educação é um direito básico implementado desde a Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989 e a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951. Contudo, segundo publicação da Unesco:

“A existência de crianças e adolescentes refugiados fora da escola é uma questão de grande preocupação. Entre os refugiados, apenas 50% das crianças frequentam a educação primária e apenas 25% estão na educação secundária.” (MOUMNÉ e SAKAI, 2019)

Essa realidade é observada principalmente, além da já mencionada barreira linguística em tópico anterior, na falta de preparo para que as escolas recebam refugiados. São necessários mais debates sobre a temática entre o corpo discente, além de uma maior sensibilização e treinamento do corpo docente perante uma criança ou adolescente, por exemplo, que vem de uma cultura distinta e pode se encontrar com algum tipo de trauma. Ademais, há a questão burocrática sobre a exigência de determinados documentos que podem dificultar o ingresso no ambiente escolar.

Vale ressaltar que, há a aplicação do EJA (Educação de Jovens e Adultos), uma modalidade de ensino criada pelo Governo Federal, no município do Rio de Janeiro. Trata-se de um ensino destinado aos jovens, adultos e idosos que não completaram os níveis de educação básica na idade apropriada, possibilitando que o aluno possa concluir os estudos em menos tempo que o usual. Deste modo, os refugiados que se mostram nessas idades, se assim desejarem, podem utilizar do referido programa público.

Por fim, mostra ser imprescindível mencionar que pessoas refugiadas ou solicitantes de refúgio, segundo o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos, que possuem certificado ou diploma de qualificação, podem, conforme o art. 44, da Lei 9474/97, ter o reconhecimento de sua validade de forma facilitada por conta da situação excepcional em que se apresentam.

d) Trabalho

O direito ao trabalho é um dos “princípios e garantias” da política migratória brasileira, que é válida para os refugiados, devendo haver acesso igualitário para todas as pessoas. Porém, a dificuldade ao acesso à informação e, muitas vezes, a barreira da língua, faz com que esse acesso seja dificultado ou impossível. É essencial que, para que haja melhoria, esse tópico seja trazido para as discussões principais dos congressos, assembleias e órgãos do Brasil.

Importante lembrar, que além da informação, como para evidenciar a forma de conseguir regularizar seus documentos, como a carteira de trabalho para que o vínculo empregatício formal seja possível, é essencial a criação de empregos voltados a esse público, assim como a facilitação de transferência de diplomas de outros países. Atualmente, todo diploma universitário de fora do Brasil tem que ser validado por uma universidade brasileira pública que tenha curso reconhecido do mesmo nível e área ou equivalente.

“art. 48, §2º: os diplomas de graduação expedidos por universidades estrangeiras serão revalidados por universidades públicas que tenham curso do mesmo nível e área ou equivalente, respeitando-se os acordos internacionais de reciprocidade ou equiparação”. (BRASIL, Lei 9.394 de 1996)

Além disso, o aluno deve pagar uma  taxa referente ao custeio das despesas administrativas e a sua revalidação poderá ser tramitação simplificada ou regular. Esse processo poderá durar entre 60 a 180 dias a partir da entrega da documentação. Ainda, o Brasil não possui nenhum acordo de reconhecimento automática de diplomas de nível superior com nenhum país. Logo, é evidente que isso atrasa ou até impossibilita o acesso a empregos de maior desenvolvimento técnico a esses indivíduos.

Logo, é essencial que o Rio de Janeiro crie políticas públicas, tal qual a propagação de informação pelas mídias, como televisão, redes sociais, outdoors, entre outros, sobre os direitos e deveres do trabalhador. Ainda, a criação de meios para que seja agilizado e facilitado o processo de revalidação de diplomas. Além disso, uma política pública que o Estado poderia criar seria a da arrecadação de verba específica para o pagamento das taxas Federais dos refugiados, que na maioria das vezes não trazem renda considerável ao deixarem seus países, permitindo que a transição seja possível.

e) Moradia

Conforme o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos:

“A pessoa solicitante de refúgio tem direito à autorização provisória de residência no Brasil até a obtenção de resposta ao seu pedido, conforme prevê o Artigo 21 da Lei 9474/1997 (Estatuto dos Refugiados) e Artigo 31, parágrafo 4° da Lei 13.445/2017 (Lei da Migração).”

Além disso, caso não possua um lugar para residir, o indivíduo tem o direito de ser encaminhado para um abrigo. No Rio de Janeiro, esta providência é realizada por meio de uma triagem dos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS). Esse encaminhamento, entretanto, para crianças desacompanhadas, dá-se pelo Conselho Tutelar da cidade.

Interessante observar que, em São Paulo, por exemplo, há abrigos projetados especialmente para receber solicitantes de refúgio e refugiados, conforme a ACNUR. No Rio de Janeiro, um importante projeto desenvolvido pelo PARES Cáritas RJ foi a Casa de Acolhida Papa Francisco. Este projeto se trata de abrigo temporário destinado a venezuelanas solicitantes de refúgio que se encontram em Roraima em extrema vulnerabilidade. Assim, com mulheres que aceitem, voluntariamente, participar do programa, e apoio das Forças Armadas e das agências da ONU, por um período de até 6 meses, há um apoio para que documentos sejam regularizados, acompanhamento psicológico, matrículas de seus filhos em escolas, inserção profissional e cursos de capacitação profissional e de português. Mediante uma capacidade máxima de até 40 pessoas, desde 2018, 97 venezuelanas já deixaram a casa e, em janeiro de 2020, 38 estavam lá residindo.

f) Acesso à justiça, à dignidade da pessoa humana e à liberdade

Assim como qualquer cidadão brasileiro, o refugiado possui direito de acesso à justiça. Deste modo, caso não possua condições de pagar pelos serviços de advogados, é cabível procurar a Defensoria Pública, segundo a cartilha “Pessoas Refugiadas e Solicitantes de Refúgio no Brasil”.

Além disso, há entidades que oferecem assistências jurídicas gratuitas aos solicitantes de refúgio e refugiados na cidade do Rio de Janeiro, como é o caso do Centro de proteção a refugiados e imigrantes (Cepri) – Casa Rui Barbosa, especializado em atendimentos sobre “casos que envolvam violência de gênero, perseguição baseada em orientação sexual e/ou identidade de gênero e menores desacompanhados ou separados”.

Dito isto, essencial citar que, a Constituição Federal do Brasil prevê em seu art. 1º, III, a dignidade da pessoa humana. Além disso, promove, através de seu art. 3º, IV, “o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação“, sendo passível de punição “qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” (art. 5º, XLI, CF). Inclusive, em 1989, foi sancionada a Lei 7716, que prevê a punição para discriminações ou preconceitos motivados pela raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. E, pelo art. 5º, XLII, da Carta Magna, “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei“.

Logo, no direito interno brasileiro, não é permitido qualquer tipo de discriminação perante um refugiado ou solicitante de refúgio.

Ademais, sobre a questão religiosa, segundo o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos:

“Não há religião oficial no Brasil e o exercício de qualquer culto, religião ou crença é livre. Não depende da autorização de qualquer autoridade, conforme o Artigo 5°, inciso VI da Constituição Federal.”

Por fim, tendo em vista que o art. 5º, XV, da Constituição Federal prevê a “livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”, e o art. 123, da Lei de Migração, que ”ninguém será privado de sua liberdade por razões migratórias, exceto nos casos previstos nesta Lei“, as pessoas que já possuem a condição de refugiadas no Brasil tem direito a solicitar emissão de passaporte. Quanto aos solicitantes de refúgio, deve-se comunicar a necessidade de viagem ao Conare, conforme sua Resolução Normativa 23/2016.

6. CONCLUSÃO

“Humanizar a questão do migrante e do refugiado no Brasil não é só humanizar a vida dessas pessoas, mas também é humanizar a nossa sociedade, nosso Estado de Direitos” (RIVAS, 2017)

A crise dos refugiados é uma problemática atual que necessita de atenção imediata. No Brasil, o aumento do recebimento desses refugiados faz com que o impacto seja evidente e o problema irrefutável. Diante disso, percebe-se a importância de políticas públicas destinadas a essa parcela da humanidade a fim de garantir que seus direitos sejam respeitados nos mais diversos âmbitos, como a saúde, a educação e o trabalho.

Na cidade do Rio de Janeiro, por ser um dos locais de maior crescimento populacional desses indivíduos, precisa-se de atenção especial. As redes sociais podem ser um facilitador do processo de migração, pois funcionam como rede de informação e de relações no qual os refugiados podem se apoiar. Além disso, é essencial a presença de ONGs que auxiliem as situações referentes ao exposto cenário. Importante lembrar que é fundamental o debate entre o corpo discente e docente, principalmente, a fim de criarem ideias positivas à causa.

Portanto, embora seja uma problemática que deve ser enfrentada por todos os Estados e seus respectivos municípios, em conjunto, vislumbra-se na capital um público alvo bastante volumoso. De modo que, mostra ser imprescindível seu foco na elaboração de políticas que auxiliem a garantia de direitos dos refugiados, bem como a dos solicitantes de refúgio.


Idealizada na PUC-Rio e focada na realidade brasileira, a Liga de Políticas Públicas da PUC-Rio visa o estudo e a discussão das boas práticas políticas. É também parceira da Iniciativa RioMais.


* As opiniões expressas neste texto são de exclusiva responsabilidade do autor.
** Foto de Divulgação: Julie Ricard/Unsplash

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Crime e Juventude: o que pode ser feito no Rio de Janeiro?

*Por Eduarda Schmidt e Maria Clara Soares, membros da Liga de Políticas Públicas da PUC-Rio

  1. CRIME NA ADOLESCÊNCIA, SEGUNDO A CIÊNCIA

    Uma das explicações para a grande concentração do crime entre jovens é a existência de um pico de violência e agressividade durante a transição da infância para adolescência. Diversas evidências, como o relatório da Corporación Andina de Fomento (2014), apontam que a maioria dos crimes são cometidos por jovens. Piquero, Farrington e Blumstein (2007) e Blokland e Nieuwbeerta (2009) concluíram que a entrada em atividades criminosas se dá durante a fase dos 8 aos 14 anos, atingindo um pico na adolescência, entre os 15 e 19 anos. Já o abandono da criminalidade se dá, em média, entre 20 e 29 anos, o que pode ser explicado neurológica e psicologicamente. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) (Beck [TV1] , 2011) mostra que uma das principais razões para o comportamento violento dos jovens tem origem em questões biológicas, sociais e cognitivas (Observatorio del Delito, 2010), que resultam atitudes impulsivas nessa faixa etária (Reyna e Farley, 2006).

  2. UM PANORAMA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

    Os dados para o Rio de Janeiro apresentados no relatório de Juventude e Crime, do Instituto de Segurança Pública, corroboram as evidências apresentadas acima: 52,4% das autuações em flagrante ocorridas no Estado entre 2010 e 2014 foram direcionadas a jovens entre 15 e 24 anos e atingem um pico de ocorrência aos 17 anos, tendendo a reduzir com o aumento da idade. Os dados permitem também estabelecer alguns padrões por faixa etária, tais como os tipos de crimes cometidos, a velocidade de renitência e a tendência de cometer atos infracionais
    desacompanhados.

    Em relação à renitência – definida juridicamente como pessoas que são pegas em flagrante mais de uma vez- dentre todos os 20.076 autuados no estado do Rio de Janeiro ano de 2010, 7.157 renitiram até o final de 2014, representando uma taxa de 34,6%. Analisando-se a distribuição da renitência por faixa etária, há um pico entre os 16 e 17 anos, com taxa de 35%, enquanto entre 18
    e 19 anos a taxa é de 27%. Em média, um adolescente de 16-17 anos volta a ser autuado 16 meses depois, enquanto jovens na faixa dos 18-19 demoram 20 meses.

    Por mais que o pico de violência seja ultrapassado durante a fase dos 20 anos, as consequências de ter cometido atividade criminal na adolescência continuam a impactar o indivíduo durante a idade adulta, por exemplo, dificultando o acesso ao mercado de trabalho devido ao seu histórico criminal (Finlay, 2008). Diante disso, é importante pensar em políticas públicas que ajam ex-ante, no sentido de prevenir a entrada de jovens na atividade criminal mais do que discutir a possibilidade de uma redução da maioridade penal, cujas evidências já indicaram ser uma medida que reduz a probabilidade do jovem terminar o ensino médio, além de aumentar a probabilidade dele cometer crimes na fase adulta (Aizer & Doyle, 2015).

    Ainda, analisando o contexto do Rio de Janeiro, [TV2] nota-se que a maioridade penal por si só não induz uma redução da atividade criminal: 7,6% do total das autuações em flagrante ocorridas no estado entre 2010 e 2014 foram direcionadas a adolescentes de 17 anos, ao mesmo tempo que 6,8% foram direcionadas a jovens de 18 anos, representando uma diferença de apenas 0,8%.[TV3]

  3. POLÍTICAS PÚBLICAS: O QUE, DE FATO, FUNCIONA?

    Ao se discutir intervenções com foco em prevenção ao crime na juventude, dois tipos de abordagens¹ são mais comuns: programas de treinamento e emprego para jovens ou policiamento ostensivo – opção historicamente escolhida no estado do Rio de Janeiro, onde, somente no ano de 2017, 174 crianças e jovens morreram em decorrência de intervenções policiais (Dossiê da Criança e do Adolescente, 2018). Entretanto, uma literatura mais recente vem apresentando uma nova
    abordagem que busca mitigar crime e violência durante a adolescência através da terapia cognitivo-comportamental. O que as evidências indicam é que esse tipo de abordagem não apenas parece ser mais eficiente, como também pode ser uma opção relativamente mais barata, por se tratar de uma política de curta duração e que é focalizada em homens jovens de baixa renda.

    O foco principal de programas sociais que utilizam a terapia cognitivo-comportamental é alterar a maneira com que adolescentes tomam decisões, fazendo com que eles passem a refletir com mais cuidado antes de realizar qualquer tipo ação. Para isso, utiliza-se de atividades simples que desenvolvem autocontrole, habilidades sociais e inteligência emocional [TV5] . Um exemplo bem-sucedido desse tipo de política foi o Becoming a Man, programa aplicado em escolas de Chicago tendo como base a psicologia da automaticidade (Heller et al., 2017)- uma teoria segundo a qual todos os seres humanos têm a tendência de desenvolver respostas automáticas que condizem com o ambiente no qual se está inserido. Isso faz com que adolescentes que vivem em regiões com altos índices de violência tendam a reagir agressivamente a qualquer tipo de situação na qual se sentem confrontados.

    Um tipo de atividade realizada com os participantes do Becoming a Man consistiu em dar um objeto para um jovem e pedir para que algum colega o pegasse para si, o que, para muitos dos participantes, foi feito por meio da força. Em seguida, um orientador conversava com os adolescentes e demonstrava que simplesmente ter pedido o objeto para o colega teria funcionado.
  1. EVIDÊNCIAS

    A avaliação do Becoming a Man apontou que, em comparação aos alunos que não tiveram acesso à terapia-cognitivo comportamental, houve redução do número de prisões por aluno e redução do comportamento violento dos participantes – efeitos que perduraram durante um ano após o final do programa – além de aumento na probabilidade do aluno participante terminar o ensino médio no tempo certo. Ainda, pesquisadores da avaliação conduziram testes com os
    participantes, os quais demonstraram que o programa foi, de fato, capaz de gerar mudanças comportamentais, pois os participantes passaram a levar mais tempo para tomar decisões ao invés e agir de forma automática, como faziam previamente.

    Há mais duas avaliações de intervenções similares (JPAL, 2017) que também apresentaram resultados positivos: detentos que participaram um programa de TCC realizado em centros de detenção temporária de jovens, também em Chicago, tornaram-se menos propensos a serem
    readmitidos dentro de um período de 2 meses – efeito que perdurou durante 1 ano e meio após o fim do programa – além de uma intervenção realizada na Libéria, que combinou um programa de
    terapia cognitivo-comportamental com um programa de transferência de renda para homens jovens e obteve resultados similares aos do Becoming a Man.

    Vale ainda ressaltar que experiência avaliada na Libéria é um caso interessante de ser explorado. Ambas as experiências com programas de TCC realizadas em Chicago foram implementadas em instituições pré-existentes, como escola e centro de detenção de jovens, dois
    ambientes nos quais há mais facilidade de se atingir o público-alvo do programa. Em contrapartida, a intervenção na Libéria foi conduzida por uma ONG local que, através de suas conexões e de sua forte reputação com líderes comunitários, conseguiu, de forma bastante efetiva, identificar o público de interesse e atraí-lo a participar do programa.

  2. APLICAÇÃO NO RIO DE JANEIRO

    O Rio de Janeiro historicamente adota políticas de combate ao crime pautadas na repreensão, como é o caso do policiamento ostensivo. No entanto, novas abordagens de política pública já foram avaliadas e também se mostram possíveis. Nesse sentido, é importante explorar outros tipos de políticas de combate ao crime e à violência, principalmente aquelas que ajam no sentido de prevenir a entrada de jovens na criminalidade.

    Apesar de programas de terapia cognitiva-comportamental já terem sido avaliados em outros contextos e terem se mostrado eficazes e custo-efetivos, isoladamente, eles não são suficientes. Os problemas do Rio de Janeiro referentes à violência e à criminalidade são extensos e exigem mudanças que sejam capazes de atacar as desigualdades estruturais que levam os indivíduos à atividade criminal.

Idealizada na PUC-Rio e focada na realidade brasileira, a Liga de Políticas Públicas da PUC-Rio visa o estudo e a discussão das boas práticas políticas. É também parceira da Iniciativa RioMais.


* As opiniões expressas neste texto são de exclusiva responsabilidade do autor. ** Foto de Divulgação: Ari Spada/Unsplash

Notas de Rodapé
[1]https://www.povertyactionlab.org/sites/default/files/Day1_Part2_CaseStudy.pdf

Referências Bibliográficas

Aizer, A., & Doyle Jr, J. J. (2015). Juvenile incarceration, human capital, and
future crime: Evidence from randomly assigned judges. The Quarterly Journal of Economics, 130(2), 759-803.

BECK, J. S. (2011). “Cognitive Therapy: Basics and Beyond”. The Guilford Press.

Blokland, A. A. J. e Nieuwbeerta, P. (2009). “Life Course Criminology”.
International Handbook of Criminology, p. 51-92.

BRASIL (1990). “Estatuto da criança e do adolescente”. Lei nº .069/1990.
Presidência da República, Casa Civil.

Caballero, B. (2016). JUVENTUDE E CRIME.

Corporación Andina de Fomento (2014). “Por una América Latina más segura: Una nueva perspectiva para prevenir y controlar el delito”.

Dossiê criança e adolescente: 2018. Org: Flávia Vastano Manso e Luciano de Lima Gonçalves. Rio de Janeiro: Instituto de Segurança Pública, RioSegurança, 2018.

FALCONI, Romeu (1998). Sistema Presidial: Reinserção Social? São Paulo:
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Finlay, K. (2008). “Effect of employer access to criminal history data on the labor market outcomes of ex-offenders and non-offenders”. National Bureau of Economic Research. Working Paper 13935.

Heller, S. B., Shah, A. K.,Guryan, J., Ludwig, J., Mullainathan, S., Pollack, H. A. (2015). “Thinking, Fast and Slow? Some Field Experiments to Reduce Crime and Dropout in Chicago”. National Bureau of Economic Research. Working Paper 21178.

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Morse, B. “Case Study: Cognitive Behavioral Therapy in Liberia”. J-PAL
Global.

Observatorio del Delito (2010). “Niños, niñas y adolescentes: víctimas y
victimarios”. Dirección de Investigación Criminal e INTERPOL.
Piquero, A. R., Farrington, D. P., Blumstein, A. (2007). “Key Issues in Criminal

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Reyna, V., Farley, F. (2006). “Risk and rationality in adolescent decision
making: implications for theory, practice, and public policy”. Psychological
Science in the Public Interest, 7(1), p. 1-44.